Na época do materialismo ateu, consideravam a função sexual
dos homens apenas como meio de satisfação da libido, cujas conseqüências
naturais podiam ser evitadas com violações arbitrárias das leis da natureza.
O fanatismo racial dos últimos anos, sem nenhum sentimento
espiritual, descobria no instinto sexual um meio para tomar o próprio povo
grande e poderoso, pronto a combater e exterminar outros povos e outras raças,
mediante o desprezo dos direitos humanos mais primitivos, aniquilando ou
impedindo a vida dos seres fracos e não idôneos para a luta e criando os
descendentes da raça pura. Diante desse conceito de vida sexual, contrário à
dignidade humana, perguntamos qual seja o significado e o alvo da sexualidade,
desejado por Deus e digno do homem. Da resposta a essa pergunta aparentemente
teórica, resultam conseqüências para a psicologia e para a prática da cura
pastoral. Indica-se em geral a geração de nova vida e a propagação da espécie
como objetivo da sexualidade humana. É a verdade, porque está de acordo com a
natureza de muitas qual idades sexuais do homem e da mulher. Mas aí não está a
relação completa do complexo sexual e, menos ainda, da grande diferenciação
psíquica que se manifesta nos dois sexos. E mesmo se toda a esfera sexual se
destinasse à procriação, ficaria sempre a pergunta: Por que o Criador quis para
a geração justamente a forma bissexual, quando no resto da natureza existem
também outras formas de propagação? “Mas a essência da sexualidade deve ter
razão mais profunda, uma vez que abarca e fundamenta também as peculiaridades
psíquicas dos dois sexos. Observação demasiadamente superficial pode
demonstrar-nos que o homem e a mulher completam-se reciprocamente, que se
comportam como partes de um todo de natureza superior, mesmo em outros setores
que nada tem a ver com a procriação. O homem parece fragmentado na sua
totalidade física e psíquica. Uma relação polar de atração e repulsão
recíproca, de um procurar-se e escapar-se, fornece os elementos de processo
vital singular. Nessas tensões está expressa a intenção do Criador, segundo a
qual os dois sexos devem fundir-se numa síntese determinada, completar-se
reciprocamente numa criação ulterior, que ultrapasse os indivíduos, sem anulá-los”
(F. Zimmermann).
Mas nem mesmo a função integradora dos sexos, no sentido do
aperfeiçoamento de cada um, explica o significado último da sexualidade. Surge
outra pergunta: por que Deus criou cada ser humano de tal forma que tenha
necessidade de um complemento, e por que, por outro lado, esse complemento deve
vir por meio de outro ser pessoal? Estamos aqui na metafísica da sexualidade. A
razão última está apenas na vontade do Criador de dar vida, por meio do ser
particular, a organismo humano superior: a comunidade dos indivíduos
diferenciados. Na ordem do plano divino da criação, essa comunidade está
colocada acima do ser particular; o todo tem mais valor que as partes. O
indivíduo está orientado para a comunidade e a ela deve servir. Assim a comunidade
homem-mulher é o protótipo e o modelo de qualquer comunidade humana. Nela o
homem e a mulher atingem o aperfeiçoamento natural, nela o ser pessoal eleva-se
à vida vivida em conjunto, um pelo outro, em complemento recíproco. Por isso a
família não é uma comunidade, mas a comunidade dos homens. E justamente não só
no setor natural, mas também no religioso. “A cabeça de todo homem é Cristo, a
cabeça da mulher é o homem, e cabeça de Cristo é Deus... O homem, portanto, não
deve cobrir a cabeça, porque é imagem e glória de Deus, mas a mulher é glória
do homem. De fato, o homem não é da mulher, mas a mulher do homem. Pois o homem
não foi criado para a mulher, mas a mulher para o homem” (1 Cr 11.3ss). A
sociedade entre o homem e a mulher, a simbiose sexual, não tem, portanto, como
finalida de só a troca de bens terrenos, mas por tarefa suprema a mediação
entre a comunidade e Deus. A mulher chega a Deus por meio do homem, como Deus
chega à mulher por meio do homem. Assim aconteceu na criação da mulher e assim
continua na criação posterior, no processo vital dos sexos. Dessa forma o homem
é o mestre e o sacerdote da mulher. Antes do pecado original o vínculo conjugal
era também comunhão sobrenatural com Deus, no qual o homem foi mediador dos
bens e das graças divinas. A mulher foi santificada mediante a união com o
homem; por meio dele a mulher era admitida não só à comunicação da natureza
humana mas também à da vida divina da graça. Com o pecado original, no qual o
homem caiu por meio da mulher, a corrente da vida sobrenatural separou-se do
vínculo conjugal e agora caminha por conta própria.
O matrimônio torna-se agora, segundo o ensinamento do
apóstolo Paulo, o grande mistério e a imagem da união vivificadora e cheia de
graça de Cristo com sua Igreja.“ Na nova ordem, também o vínculo sexual foi
santificado, como imagem da união de Cristo com a alma em estado de graça, como
era no estado primitivo, quando o homem representava ainda para a mulher o
mediador da graça sobrenatural. Com a santificação do homem e da mulher,
mediante a união com Cristo, também se leva a sua união novamente à função
sobrenatural originária. No matrimônio consagra-se o homem outra vez sacerdote
da mulher, de modo que o casamento, como no estado primitivo, se torna comunhão
não só de bens humanos, mas também dos bens divinos” (Zimmermann).
Deste conceito conclui-se que o homem deve ser social e
econômico, guia do círculo familiar não só no aspecto social e econômico mas
também religioso. É uma inversão da ordem desejada por Deus que o homem seja
levado pela mulher ao cumprimento dos deveres religiosos. Infelizmente, tal é a
situação de hoje, na maioria das famílias. Impõem-se a renovação e o
aprofundamento da religiosidade masculina, se quisermos que as famílias possam
merecer o nome de “cristãs”. A devoção das mulheres e das crianças não é
suficiente para conservar a religião de um povo. A vida pública é sempre
determinada pelo homem. E a vida religiosa não é só assunto privado, mas em
primeiro lugar público, dever da coletividade.
O homem não pode cumprir com sucesso a missão de sacerdote
da família se não estiver pronto para o sacrifício. O sacrifício é também e
sempre o dever principal do sacerdote. O sacrifício especial do homem na
família consiste em ter de providenciar e carregar a responsabilidade
principal, para que o casamento fique puro e sagrado, e se conserve a
fidelidade conjugal. Todos sabem que o Redentor restabeleceu o ideal do
matrimônio único e indissolúvel, como era antes da queda do homem, como norma
obrigatória para todos os tempos. A indissolubilidade e a unidade não são
exigidas só pela relação numérica dos sexos, mas também pela dignidade da vida
espiritual dos homens. “O erro fundamental de qualquer tentativa moderna de
reformar o matrimônio uno e indissolúvel, como instituição superada, parte da
ideia de ser o amor conjugal embriaguez dos sentidos. O verdadeiro amor
conjugal é uma forma duradoura com complementação recíproca do próprio ser. O
amor verdadeiro, digno do homem e moralmente elevado, é uma das experiências mais
profundas do homem. Mas, quanto mais profunda é uma experiência, tanto mais
singular e tanto menos se sente a necessidade e o desejo de repeti-la sob outra
forma, pois é capaz de encher uma vida inteira com o ardor e a força que
possuir” (Ruland).
Para compreender a psicologia da vida sexual é preciso
conhecer também a natureza e a função do pudor. O materialismo procurou muitas
vezes considerar o pudor como simples resultado da educação e não elem ento
natural da vida psíquica. Ao contrário, devemos afirmar que também a psicolog
ia médica concebe o pudor como fenômeno profundamente enraizado no conjunto dos
reflexos e não produtos da educação convencional como querem apresentá-lo os
cultores de nudismo exagerado.
Considerado do ponto de vista psicológico, o pudor ocupa
posição intermediária entre o instinto da cólera e o do medo. Na essência
consiste em sentimento penoso de repugnância que se levanta, quando terceiras
pessoas, sem consentimento pessoal, procuram imiscuir-se, como espectadores ou
testemunhas, na realidade da própria sexualidade consciente. Fisiologicamente,
acompanhado reação positiva, característica dos sentimentos do grupo colérico
(p. ex. rubor no rosto), comportando, todavia, ao mesmo tempo, sensações de
aborrecimento, como a encontramos nos sentimentos do grupo medo. O pudor surge
no homem como defesa evidente da alma contra a imposição da vida instintiva.
Como defesa extremamente íntima da alma, protege o homem de índole boa contra a
condescendência impensada às instigações do impulso instintivo, pois encontra
nesse sentimento, corretivo psíquico e contrapeso. Devido a essa finalidade
própria, compreende-se como o pudor seja notavelmente mais fraco na idade
infantil e senil, e não nos anos de pleno vigor sexual. Encontramos de igual maneira,
proporção direta entre a intensidade do pudor e a força do instinto sexual, de
modo que devido ao forte sentimento de pudor podemos inferir forte instinto
sexual e vice-versa. Julga-se e ressente-se a ofensa ao pudor de maneiras
diferentes, conforme o costume, origem, clima e circunstâncias. Por isso a
divisão do corpo em partes decentes, menos decentes e indecentes, como
encontramos em velhos e, infelizmente, em recentes tratados de moral, não tem
fundamento teórico nem serve para o julgamento prático do lícito ou do
indecente, como se tratasse de uma espécie de circunscrição de zona
determinada. Assim dizendo, naturalmente, não queremos desconhecer ou negar
que, nas circunstâncias normais da vida, os desnudamentos de vários gêneros
possam produzir maior ou menor escândalo ou ter efeitos excitantes. Mas nada do
que Deus criou é pecaminoso ou indecente em si mesmo, e o efeito lesivo ao
pudor depende das circunstâncias , que não têm relação alguma com as partes do
corpo. Não há dúvida que algumas vezes a nudez completa é menos excitante que
um vestido provocador, que acentua as formas do corpo em vez de escondê-las,
estimulando ainda mais a fantasia. Uma mulher que amamenta o filho, produz
menos excitação que uma jovem que participa de uma dança com um vestido
transparente e muito decotado. O problema todo contém no terreno prático, o
mesmo fator irracional da vida real que se encontra por toda parte; e é
justamente muito difícil e complexo para poder resolver-se mediante fórmulas
simples.
Apresentamos agora um resumo de algumas considerações de
Rhaban Liertz, relacionadas com as questões no seu livro “Harmonien und
Disbarmonien des menschlichen Trieb-und Geistelebens” (Harmonias e desarmonias
na vida sexual e espiritual do homem).
A escolha dos futuros cônjuges, na hipótese de que a causa
primeira do matrimônio seja o amor e não outras razões, como herança, imposição
dos pais etc., depende de poucos elementos decisivos, conscientes e pessoais.
Sabemos que o primeiro movimento de uma atração erótica surge independentemente
da vontade do indivíduo. O homem parece atraído mais pelas formas e pela graça
da mulher e esta mais pelo comportamento dele. Felizmente a beleza constitui
valor que não é super-valorizado em geral no reino do inconsciente; e muitos
reconhecem que uma pessoa externamente bela não é de per si e em todas as
circunstâncias a mais desejável. Parece que a faculdade seletiva da atração
sexual tenha vista mais perspicaz para distinguir o comportamento do que para
apreciar a forma e saiba avaliar, com segurança surpreendente, o incremento
necessário de força que o completamente da afinidade seletiva promove em favor
da geração futura. Só assim se explica o amor que determinado indivíduo sente
por determinada pessoa, amor que muitas vezes parece inconcebível a terceiros.
Os motivos mais profundos e decisivos da atração por determinada pessoa e o
desejo de tê-la como companheira de vida, escapam ao julgamento humano e
permanecem misteriosos. É curioso que, muitas vezes, justamente os seres de
natureza diversa sintam atração recíproca, enquanto os de índole igual ficam
indiferentes. A ciência biológica atribui esse fenômeno à intenção oculta da
natureza que tende ao bem da descendência, mais garantido pela união de
elementos heterogêneos. Mas daí resultam não poucas crises matrimoniais e
divórcios. Prova-se também que a atração sexual entre dois indivíduos resulta
de fatores em parte desconhecidos para nós, que contêm freqüentemente elementos
irracionais, verificando-se que a atração pode manifestar-se mesmo quando não
existe perspectiva alguma de matrimônio. Não se trata de assunto de muitos
romances: é causa de inúmeras tragédias na vida real. O amor que o homem dedica
à mulher que deseja desposar apresenta tendência es tranha à idealização e à
supervalorização que parecem indispensáveis ao eu p ara aceitar ligação tão
forte como a do amor. Também a mulher, no entusiasmo do afeto, parece não
perceber os defeitos do homem, mesmo os grandes e evidentes, ou, pelo menos,
espera, confiante, que Ele queira livrar-se dEles por amor a ela. Assim se
explica, por exemplo, que uma jovem case com um homem que sabe ser beberrão
inveterado.
Para compreender a atração recíproca dos sexos ajuda o
conceito da chamada polaridade. Esta compreende não só uma diferença qualitativa
de reações, mas também uma espécie de tensão que impele à compensação. Sua lei
é: “os elementos heterogêneos se atraem, enquanto os homogêneos se repelem”.
Niedermeyer diz: “Os dois sexos se completam um ao outro, tanto mais
perfeitamente quanto mais acentuadamente a personalidade de um encontra
compensação na polaridade heterogênea do outro”.
À luz deste princípio torna-se evidente que um homem, de
caráter acentuadamente masculino, sinta-se atraído por uma mulher de caráter
feminino-materno e repelido por uma mulher de maneiras masculinas. A
supramencionada atração explica o “matrimônio de contrastes”.
Um homem de maneiras femininas sentir-se-á atraído por
mulher máscula. Tal “matrimônio de contrastes ao reverso” pode, às vezes,
conduzir à compensação esperada. Considerando, porém, que a intersexualidade
bitola-se muitas vezes por fenômenos de degenerescência psicopata, essa infeliz
atração recíproca conduz ao aumento das dificuldades de vida para ambas as
partes, e é também desfavorável à descendência, visto poder originar taras
hereditárias e degenerescências ou, pelo menos, provocar atritos, dificuldades
e conflitos. Podemos, além disso, revelar neste ponto que, segundo as
experiências da biologia moderna, em todo organismo masculino existem também
hormônios sexuais femininos, e no físico feminino estão presentes hormônios
masculinos. Por isso em qualquer caráter encontramos algum vestígio do outro
sexo (Pesquisas de Eugênio Steinach).
Levando em consideração estes fatores biológicos,
compreendemos melhor a observação de Kafka, estranha à primeira vista: “Parece
que certo quantum de tendências homossexuais age mais ou menos oculto na alma
de todos, e logo que intervêm condições favoráveis, pode explodir abertamente”.
É justamente a observação de Liertz, com relação a certas
mulheres que, às vezes, importunam até o obreiro do Senhor. Diz Ele: “Há
mulheres que recusam o homem como participante da vida sexual e isso um pouco
por aversão à parte que desempenham na função sexual; mas não sabem renunciar
completamente ao homem, como estímulo da sua feminilidade. Escolhem como amigo,
mais inconsciente que conscientemente, o celibatário, pois sentem-se assim mais
seguras dos perigos da maternidade. Concentram nEle todos os afetos que, de
outra forma, dada a intensidade de desejo sem ligação, trabalhariam no ar.
Desde que esta situação não pode dar satisfação completa, a amizade degenera em
toda espécie de bolores sentimentais, mórbidos e psicopatas”. Cada pastor de
alma, que vive no meio do mundo, o sabe por experiência.
Tem-se ventilado inúmeras vezes a questão da possibilidade
de uma amizade pura entre homem e mulher, fora do matrimônio. Uma vez que tais
amizades existem e sempre existiram, não podemos duvidar de sua possibilidade.
Mas, são exceções raríssimas, possíveis só onde há firmeza especial de caráter
e uma graça extraordinária. Em linhas gerais estamos de acordo com Rhaban
Liertz, quando afirma: “A amizade autêntica é possível só na mais íntima
comunhão de vida, como acontece na união harmoniosa do homem e mulher com o
casamento. Por isso é mais aconselhável que o solteiro, que quer persever ar no
propósito de vida continente, renuncie a qualquer amizade com uma mulher. Tanto
mais se deve, de modo absoluto, evitar tudo o que entre no âmbito de comunidade
conjugal; de modo especial todas as demonstrações externas de afeto, sobretudo
a que é expressão típica do desejo de união, isto é, o beijo e o abraço. Uma
amizade verdadeira, completa entre homem e mulher não é possível senão no
matrimônio”. Devemos acrescentar, para sermos completos e justos que há
manifestações de afeto e também fora do matrimônio podem surgir amizades (pelo
menos entre homens) que são notavelmente mais profundas, espiritualmente
harmoniosas e radicadas na alma, do que tantas amizades entre cônjuges.
Cada educador e pastor de almas devem visar à criação de uma
união definitiva só nas criaturas, que não se amam unicamente com amor sexual,
mas sobretudo do profundo da alma. Os matrimônios puramente convencionais ou de
interesse econômico ocultam sempre um risco perigoso. O casamento de pessoas
pouco exigentes com relação às qualidades do respectivo cônjuge não é,
felizmente, sempre tão funesto como seria de temer. A parte que mais sofre é a
mulher que, também no matrimônio aparentemente feliz, obtém em geral muito
menos amor por parte do marido do que espera e merece em consideração ao grande
sacrifício de mãe.
É dever da educação, da direção religiosa e da influência da
mulher levar o homem ao amor nobremente humano e cristão, apesar do egoísmo
inato e sensualidade intensa, de modo que trate a mulher com bondade, respeito
e delicadeza e a venere com companheira digna de sua vida. A mulher, porém,
deverá aprender a se resignar, se não puder encontrar nem mesmo no mais
profundo e mais terno amor terreno a satisfação perfeita da sua alma, pois Deus
criou para si o coração do homem e por isto este ficará inquieto enquanto não
encontrar no amor divino a paz eterna e perfeita.
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