Pela palavra caráter em psicologia, entende-se a
peculiaridade psíquica que determina o comportamento e a atuação da pessoa. É
evidente que, para o conhecimento dos homens, importa antes de tudo individuar
e julgar-lhe o caráter.
A qualidade de um caráter depende acima de tudo da mola que
faz saltar as ações e os sentimentos, isto é, da disposição congênita que
condiciona a orientação fundamental da vontade. São as tendências inatas do
homem que determinam a diversidade das orientações práticas. Embora os dot es
intelectuais tenham importância na formação do caráter, todavia, a caus a
principal da diferença dos caracteres encontra-se especialmente no campo do
sentimento e da vontade. A tal respeito devemos distinguir dois tipos opostos:
o homem sentimental (que corresponde, do ponto de vista da vivacidade e mudança
rápida de sentimentos, ao temperamento sanguíneo; ou ao melancólico, na
profundeza e duração dos sentimentos) e o homem volitivo (que corresponde ao
temperamento colérico). No homem sentimental predomina o impulso à dedicação,
enquanto no volitivo é muito acentuado o instinto de conservação. Todas as
diferenças do caráter derivam da dosagem desses dois impulsos fundamentais:
dedicação e conservação. Assim, com o instinto de dedicação se entrelaça o amor
à verdade, beleza, humanidade, além da paixão nobre que se manifesta em forma
passiva na capacidade de amor, na veneração, espírito de sacrifício e
semelhantes; em forma de reação (isto é, suscitada por fato externo) no
interesse pelos outros, compaixão, indulgência etc.; em forma ativa, na
dedicação apaixonada. Essa passionalidade pode encontrar-se também sob as
vestes da avareza, da paixão pelo jogo, do vício de beber, ciúme, sede de
vingança e avidez sexual. Se, ao contrário, na união dos dois impulsos domina o
instintivo de conservação, as características do quadro psíquico serão o
realismo forte, a necessidade de independência, a consciência, o sentimento de
responsabilidade. Mas se o instinto de conservação toma formas egoístas, então
numa natureza ativa prevalecerá o interesse pessoal , o amor ao lucro, a mania
de domínio, a obstinação, a teimosia, a ambição e inveja; numa natureza
passiva, ao invés, resultarão a circunspeção, vigilância, suspeita,
desconfiança, esperteza, falsidade, hipocrisia e astúcia. No mesmo terreno
desabrocham depois com facilidade a necessidade de sobressair, a sede de
vingança, a malignidade, crueldade, perfídia e outras paixões, como fenômenos
de reação com que o eu responde à mortificação e ao tratamento injusto (Th.
Müncker).
Quanto ao que concerne à estrutura do caráter, devemos
distinguir três componentes. Antes de tudo a orientação congênita, ou seja as
disposições naturais do caráter. A esses elementos intrínsecos do caráter
acrescentam-se as influências do ambiente, no sentido mais amplo da palavra.
São muito significativas, sob este aspecto, as influências voluntárias ou
involuntárias da família, do ambiente e educadores. Sabemos por experiência que
aspectos notáveis permanecem na vida psíquica do homem após a perda prematura
do pai. Provocam no menino, não poucas vezes, a dificuldade de reconhecer uma
autoridade; por outro lado, muitas vezes a morte prematura da mãe traz para o
menino o desenvolvimento insuficiente das disposições da alma e da capacidade
afetiva. Os danos causados pela falta de irmãos são muito conhecidos; por isso
não nos detem os sobre o assunto. A disposição psíquica congênita, plasmada e
modificada pelos fatores externos, desenvolve-se por fim com a participação da
vontade pessoal; pois o homem não é simplesmente, ser animal, mas ser pessoal,
senhor de si, que pode e deve livre e progressivamente desenvolver a bondade do
caráter, isto é, tornar-se personalidade moralmente preciosa. Para a formação
do caráter de um cristão é de importância decisiva o trabalho da graça divina
que se adapta, em geral, às disposições naturais e constrói sobre elas, mas que
pode seguir também caminhos próprios, porque “para Deus nada é impossível” (Lc
1.37).
No campo da caracterologia trabalhou-se muito nesses últimos
anos. Na pesquisa das vias que levam ao conhecimento do homem, partiu-se de
diversos pontos de vista e seguiram-se várias direções. Indicaremos as
principais segundo o esquema de A. Carrard.
A Caracterologia Baseada Na Psicologia Individual
Fritz Kunkel, antigo aluno de Alfred Adler, criou a
caracterologia segundo a “psicologia individual’. Como Adler, não admite as
peculiaridades hereditárias do caráter, mas atribui as singularidades pessoais
e psíquicas do homem unicamente à influência do ambiente e da educação. Segundo
Kunkel, existem no homem duas espécies de comportamento: um objetivo,
consciente das responsabilidades, corajoso; outro subjetivo, esquivo diante da
responsabilidade, covarde. Este último, que em geral domina, causa muitos
males. É a raiz de todas as distorções do caráter e das neuroses. Kunkel, na
sua concepção do homem, não se interessa pelo “de onde”, mas pelo “para que
fim”. Anseia por compreender o que o homem quer obter pela atitude. Segundo
afirma, só o homem subjetivo sofre por causa de si mesmo e é causa de todos os
males do mundo.
Distingue quatro tipos, segundo a atividade e a passividade,
a fraqueza e a dureza.
Os Tipos Do Subjetivismo :
O Vaidoso :
O tipo vaidoso deriva do menino viciado que, durante a vida,
foi centro do interesse alheio. O vaidoso é extremamente exigente e pretende a
satisfação de todos os desejos. Enquanto vamos ao encontro de suas necessidades
e desejos, mostra-se contente, de ótimo humor, não regateia na distribuição de
suas graças. Mas se lhe negamos a admiração, sem a qual não pode viver, após
certo tempo fica abatido e torna-se estúpido ou tímido.
O Tímido :
Também o tímido provém do menino viciado. Também ele procura
a satisfação dos próprios desejos, não para ser admirado, mas pela necessidade
real ou imaginária de carinho e ajuda. Porque está sempre mal não se pretende
muito dEle. Tem capacidade acentuada de sofrimento; muitas vezes encontra
protetores que o assistem benevolamente. Mas se o tímido não é atendido, se
suas lamúrias, com o andar do tempo, não suscitam outro efeito senão
aborrecimento e impaciência, a crise estoura com violência e manifesta-se em
neurose.
O Déspota :
O tipo César viveu geralmente sob educação severa e
experimentou desde cedo que não pode confiar nos adultos. Quando menino escutou
repetidamente que é mau, enquanto queria apenas mostrar-se sincero e vivo.
Via-se hostilizado em toda parte. Por isso no íntimo amadureceu esta convicção:
“os outros não querem ajudar-me, só servem para me atrapalhar, portanto, devo
arranjar-me sozinho”. Sua mentalidade torna-se egoísta e considera o próximo
como objeto, para não se ver abaixado ao nível de objeto. Ataca os outros por
autodefesa. Não experimenta nunca o sentimento da desfeita, mas apenas o da
hostilidade e fanatismo. A única alegria é a malignidade e considera como a
maior desgraça a perda da superioridade e do poder. Em geral vem a falir quando
encontra na vida outro déspota, porque nesse caso a maneira de agir não atinge
a meta.
O Indiferente :
Também o indiferente aprendeu por sua vez que não pode
contar com a ajuda dos adultos. Suas tentativas de eximir-se dela faliram pela
própria insuficiência física e espiritual, ou porque os adultos se mostraram
fortes demais. Como conseqüência vive sob o lema: “Eu sozinho não estou em
condições de ajudar-me”. Daí não chega à satisfação de seus desejos nem com o
auxílio de terceiros nem com as próprias forças. Portanto, só lhe resta a
renúncia. Se consegue renunciar a todos os desejos, pode tornar-se feliz de
igual modo, apesar da pobreza interior. Organiza a vida completamente em função
da renúncia e menospreza todo prazer de grau elevado, especialmente qualquer
companhia. Concede a si mesmo apenas a satisfação das exigências vitais: comer,
beber, dormir. Compreende -se que, segundo este modo de viver, o considerem
preguiçoso, molenga e, às vezes, também idiota, No entanto não o é. Atrás da
máscara de obtuso, escondem-se a irritabilidade e a sensibilidade, índices de
faculdade de sofrimento e delicadeza nervosa. Podemos atacá-lo; não se defende.
Resiste até o fim, até quando faltam os meios para os outros e acaba vencendo.
O comportamento do indiferente não pode s er modificado senão pelo
encorajamento.
Künkel acha fácil a tarefa do terapeuta. O paciente deve ser
levado até o ponto em que tiver aprendido a renunciar bastante ao seu
subjetivismo. Com a renúncia à pretensão de aparecer, somem também os complexos
de inferioridade. Embora os conceitos da teoria antiga não sejam completamente
idênticos aos quatro tipos de subjetivismo de Künkel, pode-se, no entanto
afirmar que o “vaidoso” corresponde aproximadamente ao sanguíneo, o “déspota”
ao colérico, o “tímido” ao melancólico e o “indiferente” ao fleumático.
As conquistas de Künkel no campo da caracterologia são muito
preciosas. No entanto, seu parecer, segundo o qual as propriedades do caráter
não seriam transmissíveis, é refutado pela experiência.
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