VERSÕES, TRADUÇÕES E REVISÕES
Conceituação
Tradução é simplesmente a transposição de uma composição literária de uma língua para outra. Por exemplo, se a Bíblia fosse transcrita dos originais hebraico e grego para o latim, ou do latim para o português, chamaríamos esse trabalho tradução. Se esses textos traduzidos fossem vertidos de volta para as línguas originais, também chamaríamos isso tradução.
A tradução literal é uma tentativa de expressar, com toda a fidelidade possível e o máximo de exatidão, o sentido das palavras originais do texto que está sendo traduzido. Trata-se de uma transcrição textual, palavra por palavra. O resultado é um texto um tanto rígido.
A transliteração é a versão das letras de um texto em certa língua para as letras correspondentes de outra língua. É claro que uma tradução literal da Bíblia fica sem sentido para uma pessoa de pouca cultura.
Versão, tecnicamente falando é uma tradução da língua original (ou com consulta direta a ela) para outra língua, ainda que comumente se negligencie essa distinção. O segredo para a compreensão é que a versão envolve a língua original de determinado manuscrito
Revisão, ou versão revista, é termo usado para descrever certas traduções, em geral feitas a partir das línguas originais, que foram cuidadosa e sistematicamente revistas, cujo texto foi examinado de forma crítica, com vistas em corrigir erros ou introduzir emendas ou substituições.
Paráfrase é uma tradução "livre" ou "solta". O objetivo é que se traduza a idéia, e não as palavras. Daí que a paráfrase é mais uma interpretação que uma tradução literal do texto. O comentário é simplesmente uma explicação das Escrituras. O exemplo mais antigo desse tipo de trabalho é o “Midrash”, ou comentário judaico do Antigo Testamento.
Versões E Traduções Mais Antigas
As traduções mais antigas apareceram antes do período dos Concílios da Igreja (350 d.C.), abarcando obras como Pentateuco Samaritano, os Targuns Aramaicos, o Talmude, o Midrash e a Septuaginta (LXX).
O Pentateuco Samaritano
Segundo Norman Geisler e William Nix (1997, p. 187), “o Pentateuco samaritano pode ter-se originado no período de Neemias, em que se reedificou Jerusalém. Não sendo na verdade uma tradução, nem versão, mostra a necessidade do estudo cuidadoso para que se chegue ao verdadeiro texto das Escrituras”. Essa obra foi, de fato, uma porção manuscrita do texto do próprio Pentateuco. Contém os cinco livros de Moisés, tendo sido escrito num tipo paleo-hebraico, muito semelhante ao que se encontrou na pedra moabita, na inscrição de Siloé, nas Cartas de Laquis e em alguns manuscritos bíblicos mais antigos de Qumran. A tradição textual do Pentateuco samaritano é independente do Texto massorético. Não foi descoberto pelos estudiosos cristãos senão em 1616, embora fosse conhecido dos pais da igreja, como Eusébio de Cesaréia e Jerônimo, tendo sido publicado pela primeira vez na obra Poliglota de Paris (1645) e, depois, na Poliglota de Londres (1657).
O manuscrito mais antigo do Pentateuco samaritano data de meados do século XIV e trata-se de um fragmento de um pergaminho o rolo chamado Abisa. O códice do Pentateuco samaritano mais antigo traz uma nota sobre ter sido vendido em 1149-1150 d.C, embora fosse muito mais velho. A Biblioteca Pública de Nova Iorque abriga outro exemplar que data de cerca de 1232. Imediatamente após a descoberta desse exemplar, em 1616, o Pentateuco samaritano foi aclamado como superior ao Texto massorético. No entanto, depois de cuidadoso estudo, foi relegado a posição inferior. Só recentemente esse documento reobteve um pouco de sua antiga importância, ainda que seja considerado até hoje de menor importância do que o texto massorético da lei. Os méritos do texto do Pentateuco samaritano podem ser avaliados pelo fato de apresentar apenas 6 000 variantes em relação ao Texto massorético, e em sua maior parte constituem diferenças ortográficas que se considerariam insignificantes. Há ali a afirmativa de que o monte Gerizim é o centro de adoração, e não a cidade de Jerusalém, com acréscimos aos relatos de Êx 20.2-17 e Dt 5.6-21. (GEISLER; NIX, 1997, p. 188).
Os Targuns
Segundo Norman Geisler e William Nix (1997, p. 188), “há evidências de que os escribas, já nos tempos de Esdras (Ne 8.1-8), estavam escrevendo paráfrases das Escrituras hebraicas em aramaico. Não estavam produzindo traduções, mas textos explicativos da linguagem arcaica da Tora”. Antes do nascimento de Cristo, quase todos os livros do Antigo Testamento tinham suas paráfrases ou interpretações (targuns). Ao longo dos séculos seguintes o targum foi sendo redigido até surgir um texto oficial.
Os mais antigos targuns aramaicos provavelmente foram escritos na Palestina, durante o século II d.C, embora haja evidências de alguns textos amaraicos de um período pré- cristão. Esses textos primitivos, oficiais, do targum, continham a lei e os profetas, embora targuns de épocas posteriores também incluíssem outros escritos do Antigo Testamento.
Durante o século III d.C., surgiu na Babilônia um targum aramaico sobre a Tora. Possivelmente se tratasse de uma versão corrigida de texto palestino antigo; mas também poderia ter-se originado na Babilônia, tendo sido tradicionalmente atribuído a Onquelos (Ongelos), ainda que tal nome provavelmente resultasse de confusão com Áquila.
O Targum de Jônatas ben Uzziel é outro targum babilônico em aramaico, que acompanhava os profetas (os primeiros e os últimos). Data do século IV, sendo uma tradução mais livre do texto que a tradução de Onquelos. Esses targuns eram lidos nas sinagogas: o texto de Onquelos ao lado da Tora, que se liam em sua inteireza; Jônatas era lido ao lado de seleções dos profetas (haphtaroth, pl.). Visto que as demais partes do Antigo Testamento (escritos) não eram lidas nas sinagogas, não se produziu nenhum targum oficial, mas havia cópias não-oficiais usadas pelas pes-soas de modo particular.
Pelos meados do século VII surgiu o Targum do pseudo-Jônatas, sobre o Pentateuco. Trata-se de uma mistura do Targum de Onquelos e alguns textos do Midrash. Outro targum apareceu ao redor do ano 700, o Targum de Jerusalém, do qual sobreviveu apenas um fragmento.
O Talmude
O Talmude basicamente representa as opiniões e as decisões de professores judeus de cerca de 300 a 500 d.C., consistindo em duas principais divisões: o Midrash e a Gemara. A Mishna (repetição, explicação) completou-se perto de 200 d.C., como se fora um digesto – publicação composta de artigos, livros condensados - hebraico de todas as leis orais, desde o tempo de Moisés. Era altamente considerada como a segunda lei, sendo a Tora a primeira. A Gemara (término, finalização) era um comentário ampliado, em aramaico, da Mishna. Foi transmitida em duas tradições: a Gemara palestina (c. 200) e a Gemara babilônica, maior, dotada de mais autoridade (c. 200)
O Midrash
O Midrash (lit., estudo textual) na verdade era uma exposição formal, doutrinária e homilética das Sagradas Escrituras, redigida em hebraico ou em aramaico. De mais ou menos 100 até 300 d.C., esses escritos foram reunidos num corpo textual a que se deu o nome de Halaka (procedimento), que era uma expansão adicional da Tora, e Hagada (declaração, explicação), ou comentários de todo o Antigo Testamento. O Midrash de fato diferia do Targum neste ponto: o Midrash eram comentários, em vez de paráfrases. O Midrash contém algumas das mais antigas hornilias do Antigo Testamento, bem corno alguns provérbios e parábolas, textos usados nas sinagogas.
Septuaginta (LXX)
Bastante conhecida através da sigla LXX, é a mais importante tradução grega do Velho Testamento. Seria interessante pensar por alguns instantes qual a razão de um livro hebraico ser traduzido para o grego numa cidade do Egito? A História nos confirma que Alexandre Magno, com suas extraordinárias conquistas levou o grego a quase todas as partes do mundo conhecido. Sua morte prematura em 323 a.C. fez com que seu império fosse dividido. Cabendo a Ptolomeu I (323-285) governar o Egito, iniciando assim a dinastia dos reis gregos no Egito. Calcula-se que no tempo de Ptolomeu II, a cidade de Alexandria era composta por um terço de judeus. Como era de se esperar esses imigrantes judeus facilmente adotaram a língua dos gregos.
Dias Gomes citando Flávio Josefo, fornece-nos pormenores úteis sobre a origem desta antiga tradução. Eis uma síntese de suas palavras:
Demétrio Palério, bibliotecário de Ptolomeu Filadelfo, trabalhava com extremo cuidado e grande curiosidade para reunir de todas as partes do mundo os livros de mérito e que julgava serem agradáveis ao príncipe. Certo dia o príncipe perguntou-lhe quantos livros já havia na Biblioteca e soube que mais ou menos 200.000. Notificou também ao rei a existência entre os judeus de livros dignos de figurarem na soberba biblioteca, mas dariam muito trabalho traduzi-los para o grego. Acrescentou que este trabalho poderia ser feito porque sua majestade não olhava a gastos. O rei, persuadido pelo ilustre bibliotecário, fez um apelo ao sumo-sacerdote de Jerusalém para que lhe enviasse os livros e pessoas capacitadas para traduzi-los. O pedido foi imediatamente atendido, talvez, porque acompanhando-o havia grande soma de dinheiro e pedras preciosas. Ptolomeu recebeu através de uma carta a seguinte notificação: "Escolhemos, Senhor, seis homens de cada tribo para vos levar as santas leis e esperamos da vossa bondade, quando não tenhais mais necessidade deles, que vos dignareis remetê-los com os que vão em sua companhia." Eleazar. Quando a obra foi acabada (segundo alguns em 72 dias), Demétrio reuniu todos os judeus para que ouvissem a leitura da tradução, na presença dos 72 tradutores. A tradução foi aprovada e Demétrio elogiado por ter concebido um desígnio que lhes era tão vantajoso. (JOSEFO, Flávio. Apud. GOMES, Dias. Bíblia Poliglota Portuguesa, p. 26-28).
Para alguns esta história é lendária, sendo a verdadeira razão para a origem da Septuaginta a seguinte: Havendo em Alexandria muitos judeus que não podiam ler o Velho Testamento no original hebraico, uma tradução em grego lhes foi preparada. Por causa do número de tradutores essa extraordinária tradução se tornou conhecida (um tanto inexatamente) como Septuaginta.
A Septuaginta é comumente designada por LXX. O nome vem do latim Septuaginta, que quer dizer 70. Aristeas, escritor da corte de Ptolomeu Filadelfo, que reinou de 285-246 a.C., escrevendo a seu irmão Filócrates, conta que o referido monarca, por proposta de seu bibliotecário, Demétrio de Falero, solicitou ao sumo sacerdote judaico, Eleazar, que lhe enviasse doutores versados nas Sagradas Escrituras para preparar-lhe uma versão delas, em grego. Ele muito ouvia falar das Escrituras e queria uma versão delas, para enriquecer sua vasta biblioteca, em Alexandria. O sumo sacerdote escolheu 72 eruditos (6 de cada tribo) e enviou-os a Alexandria, os quais completaram a versão em 72 dias. De 72 derivou-se o nome Septuaginta. (Gilberto, Antonio, 1986, p. 84)
A tradução foi feita na ilha de Faros, situada no porto da cidade. Essa Bíblia teve a mais ampla difusão entre as nações, especialmente naquelas onde estavam os judeus da dispersão oriunda do cativeiro. Foi a Septuaginta a primeira tradução completa do Antigo Testamento, do original hebraico. Foi também ela que situou e dividiu os livros por assuntos como os temos hoje: Lei, História, Poesia, Profecia. Não há um só exemplar original da Versão dos Setenta; somente cópias, a mais antiga das quais data de 325 d.C. É ela a mais antiga tradução da Bíblia hebraica. A Septuaginta é usada ainda hoje na Igreja Grega. Sua primeira aparição impressa é a constante da Complutensiana Poliglota publicada em Alcalá, província de Madri, em 1514-1517, e distribuída em 1522 pelo Cardeal Ximenes.
A Versão De Áqüila
A versão de Áqüila, natural de Sínope, cidade do Ponto. É uma tradução puramente literal. Contém só o Antigo Testamento. Foi feita em 138 d.C., no reinado de Adriano. Existe em fragmentos.
A Versão De Teodocião
A versão de Teodocião, natural de Éfeso, coevo de Justino Mártir, que o menciona em seus escritos. Foi feita em 160 d.C., no tempo do Imperador Cômodo. Não é mais que uma revisão dos LXX. Contém só o Antigo Testamento. Teodocião era ebionita.
A Versão De Símaco
A versão de Símaco, feita em 218. Só do Antigo Testamento. Símaco era também ebionita. Existe em fragmentos.
A Héxapla, De Orígenes
A Héxapla, de Orígenes. Não é propriamente uma versão; é obra compendiada. Devido a falhas na tradução da Septuaginta, Orígenes, grande erudito da igreja primitiva, compôs, em Cesaréia, a Héxapla, ou versão de 6 colunas, em 228 d.C.
As seis colunas estão dispostas da direita para a esquerda, assim: 1ª O texto hebraico; 2ª O texto grego traduzido do hebraico; 3ª A versão de Áquila; 4ª A versão de Símaco; 5ª A Septuaginta; 6ª A versão de Teodocião.
Revisões Depois Da Hexapla
Fizeram ainda revisões na Septuaginta Luciano – fez seu trabalho mais ou menos pelo ano 300, pois foi martirizado em 311. Para esta revisão usou manuscritos hebraicos superiores aos usados por Orígenes e Hesíquio – sua revisão se processou na cidade de Alexandria e foi somente aceita no Egito.
Versões Siríacas
É provável que a primeira versão do Novo Testamento tenha sido feita na língua siríaca. Dentre as versões siríacas são dignas de nota as seguintes:
Siríaca Antiga. É uma versão dos quatro Evangelhos, conservada hoje com grandes lacunas nestes dois manuscritos. Embora estes manuscritos fossem copiados no 5º e 4º séculos respectivamente, a forma de texto que eles preservam data do fim do segundo século ou início do terceiro. O texto dos Evangelhos sofreu influências do Diatessaron de Taciano. Seu tipo de texto pertence ao grupo Ocidental.
Versão Peshita. Em siríaco a palavra peshita significa simples, comum, vulgar. Crêem alguns que a tradução foi feita por Rabbula, bispo de Edessa (411-432), cognominado o São Jerônimo da Igreja Síria. Outros afirmam que o autor é desconhecido, mas que a tradução foi feita para que o cristianismo pudesse propagar-se entre aquele povo. Por ser um trabalho muito bem feito, foi chamada "a rainha das versões". Contém todo o Velho Testamento sem os livros apócrifos. Do Novo Testamento não foram traduzidos II e III João, II Pedro, Judas e Apocalipse. Mais de 350 manuscritos da Peshita são conhecidos hoje, diversos dos quais datam do 5º e 6º séculos.
Versão Filoxênia. Esta é outra tradução bastante difícil de ser explicada pela Crítica Textual. Crê-se que Filóxeno, bispo de Mabugue, comissionou a tradução da Bíblia inteira baseada no grego, em 508 a.D.
Versão Siríaca da Palestina. É conhecida principalmente por um dicionário dos Evangelhos. Crêem os entendidos que seja uma tradução do quinto século.
VERSÕES LATINAS E
INGLESAS
Versões Latinas
O latim era um idioma dominante nas regiões ocidentais do Império Romano desde muito antes dos dias de Jesus. Foram nas regiões ocidentais ao sul da Gália e na África do Norte que apareceram as primeiras traduções da Bíblia em latim. Segundo Philip W. Confort (1998, p. 235) “em cerca de 160 d.C., Tertuliano notoriamente usou uma versão das Escrituras em latim. Não muito tempo depois, o texto em latim antigo parece ter estado em circulação, o que nos é evidenciado pelo uso de Cipriano antes de sua morte, em 258 d.C.”. A versão em latim antigo era uma tradução da Septuaginta. Manuscritos completos do texto em latim antigo não subsistiram. Depois que a versão latina, a Vulgata, foi completada por Jerônimo, o texto mais primitivo caiu em desuso.
A Vulgata Latina
Segundo Philip W. Confort (1998, p. 236) “por volta do século III d.C., o latim começou a substituir o grego como língua de ensino no vasto mundo romano. Um texto uniforme e confiável era extremamente necessário para uso teológico e litúrgico”. Para preencher essa necessidade, o papa Dâmaso I (336-384 d.C.) encarregou Jerônimo, eminente erudito no latim, grego e hebraico, de fazer a tradução. Jerônimo começou o seu trabalho com uma tradução da Septuaginta em grego, considerada inspirada por muitas autoridades da Igreja, inclusive Agostinho. Contudo, mais tarde, e sob risco de grande crítica, voltou-se para o texto hebraico que então estava em uso na Palestina, como texto base para sua tradução. Durante o período de 390 a 405, Jerônimo fez sua tradução latina do Antigo Testamento hebraico. No entanto, a despeito de ter se voltado para o original hebraico, Jerônimo dependia grandemente das diversas versões gregas como auxílio à tradução. Por conseguinte, a Vulgata espelha as outras traduções gregas e latinas tanto quanto o texto hebraico fundamental.
Autor Da Vulgata
Sofrônio Eusébio Jerônimo (c. 340-420) nascera de pais cristãos, em Estridão, na Dalmácia. Havia sido educado na escola local até sua ida a Roma, com a idade de doze anos. Durante os oito anos seguintes, Jerônimo estudou latim, grego e autores pagãos, antes de tornar-se cristão, com a idade de dezenove anos. Logo após sua conversão e batismo, Jerônimo devotou-se a uma vida de rígida abstinência e de serviço ao Senhor. Passou muitos anos perseguindo uma vida semi-ascética de eremita. De 374 a 379, empregara um rabino judeu para que lhe ensinasse o hebraico, enquanto estivesse residindo no Oriente, perto de Antioquia. Foi ordenado presbítero em Antioquia antes de partir para Constantinopla, onde passou a estudar sob a orientação de Gregório de Nazianzo. Em 382, foi convocado por Roma para ser secretário de Dâmaso, bispo de Roma, e nomeado membro de uma comissão para revisar a Bíblia latina.
A Data E O Lugar Da Tradução Da Vulgata Latina
Jerônimo recebeu a incumbência em 382 e iniciou seu trabalho quase imediatamente. A pedido de Dâmaso introduziu uma ligeira revisão nos evangelhos, completada em 383. Logo após ter terminado a revisão dos evangelhos, morre-lhe o mecenas (384), tendo sido eleito novo bispo de Roma. Jerônimo, que aspirava a esse cargo, já havia terminado uma revisão rápida do chamado Saltério romano quando regressou ao Oriente e se estabeleceu em Belém. De volta a Belém, Jerônimo voltou sua atenção a uma revisão mais cuidadosa do Saltérío romano, que completou em 387. Essa revisão é conhecida como Saltério galileu, empregado atualmente no Antigo Testamento da Vulgata. Baseou-se de fato nos Héxapla de Orígenes, a quinta coluna, sendo mera tradução dos Salmos. Tão logo havia terminado sua revisão dos Salmos, Jerônimo iniciou a revisão da LXX, embora esse trabalho não fizesse parte de seus objetivos iniciais. Estando em Belém, Jerônimo havia iniciado seu trabalho de aperfeiçoar seus conhecimentos do hebraico, de modo que pudesse executar uma nova tradução do Antigo Testamento diretamente das línguas originais. Os amigos ao redor aplaudiram seus esforços, mas outros, muito longe, começaram a suspeitar que Jerônimo estaria judaizando; alguns se enfureceram quando Jerônimo lançou dúvidas sobre a “inspiração da Septuaginta”. Traduziu o Saltério hebraico com base no texto hebraico usado na época, na Palestina. Finalmente, em 405, completou sua tradução latina do Antigo Testamento hebraico. Nos últimos quinze anos de vida, Jerônimo continuou escrevendo, traduzindo e revisando sua tradução do Antigo Testamento.
Jerônimo pouca atenção deu aos apócrifos; só com grande relutância produziu uma tradução apressada de algumas passagens de Judite, de Tobias e do resto de Ester, mais as adições de Daniel - antes de morrer. O resultado foi que a versão dos livros apócrifos, pertencente à Antiga latina, foi adicionada à Bíblia chamada Vulgata latina na Idade Média, sobre o cadáver de Jerônimo.
Versões, Traduções E Paráfrase Em Inglês
Segundo Philip W. Confort (1998, p. 361), “no século VI, o Evangelho foi levado para a Inglaterra pelos missionários de Roma. A Bíblia que levaram foi a Vulgata Latina. Nessa época, os cristãos que viviam na Inglaterra dependiam dos monges para qualquer tipo de instrução relacionada à Bíblia. Os monges liam e ensinavam a Bíblia latina”. Depois de alguns séculos, quando mais mosteiros foram fundados, surgiu a necessidade de traduções da Bíblia em inglês. A mais antiga tradução em inglês, até onde sabemos, é a que foi feita por um monge do século VII, chamado Cedmon, que fez uma versão métrica de partes do Antigo e do Novo Testamento. Acredita-se que outro clérigo inglês, chamado Bede, traduziu os evangelhos para o inglês. Diz a tradição que, em 735, esse clérigo estava traduzindo o Evangelho de João em seus últimos momentos de vida. Outro tradutor foi Alfredo, o Grande (que reinou de 871 a 899), considerado por todos como um rei muito letrado. Incluiu em suas leis trechos dos Dez Mandamentos traduzidos para o inglês e também traduziu os Salmos.
Desenvolvimento Da Língua Inglesa
Segundo Norman Geisler (1997, p. 219), “não se sabe com certeza como a língua inglesa se desenvolveu, mas a maioria dos estudiosos segue a orientação de Beda, o Venerável (c. 673-735), que data seu início em cerca de 450 da era cristã”. O período de 450 a 1100 é denominado anglo-saxônico, ou do antigo inglês, por ter sido dominado pela influência dos anglos, dos saxões e dos jutos em seus vários dialetos. Após a invasão normanda de 1066, a língua sofreu a influência de dialetos escandinavos, e o período do médio inglês apareceu de 1100 a 1500. Esse foi o período de Geoffrey Chaucer (1340-1400) e de John Wycliffe. Após a invenção da prensa móvel por Johann Gutenberg (c. 1454), o inglês entrou em seu terceiro período de desenvolvimento: o do inglês moderno (1500 até o presente). Esse período de desenvolvimento foi precipitado pela grande mudança vocálica no século que se seguiu à morte de Chaucer e precedeu ao nascimento de William Shakespeare.
As Traduções Parciais Para O Antigo Inglês (450-1100)
Segundo Norman Geisler (1997, p. 220), “as primeiras traduções de partes das Escrituras basearam-se nas traduções da Antiga latina e da Vulgata, e não nas línguas originais, o hebraico e o grego, e nenhuma delas continha o texto da Bíblia toda. Não obstante, elas ilustram a maneira pela qual a Bíblia entrou para a língua inglesa”.
Aldhelm (640-709). Aldhelm foi o primeiro bispo de Sherborne em Dorset. Logo depois do ano 700, ele traduziu o Saltério para o antigo inglês. Foi a primeira tradução direta de qualquer parte da Bíblia para a língua inglesa.
Egberto (700). Egberto da Nortúmbria tomou-se arcebispo de Iorque pouco depois da morte de Beda. Ele foi também o mestre de Alcuíno de Iorque, que foi mais tarde chamado por Carlos Magno para estabelecer uma escola na corte de Aix-Ia-Chapelle (Aachen). Por volta de 705, Egberto traduziu os evangelhos para o antigo inglês pela primeira vez.
Beda, o Venerável (674-735). Maior estudioso da Inglaterra e um dos maiores de toda a Europa dos seus dias, Beda residiu em Jarrow-on-the-Tyne, na Nortúmbria. De lá, ele escreveu sua famosa História eclesiástica e outras obras. Entre essas obras encontrava-se uma tradução do evangelho de João, cujo propósito foi provavelmente o de suplementar os três outros traduzidos por Egberto. Segundo relatos tradicionais, Beda terminou a tradução na hora da morte.
Alfredo, o Grande (849-901). Alfredo foi um estudioso de primeira, além de ter sido rei da Inglaterra (870-901). Durante seu reinado, a Lei Danesa foi estabelecida sob o Tratado de Wedmore (878). O tratado continha somente duas estipulações para os novos súditos: batismo cristão e fidelidade ao rei. Juntamente com sua tradução da História eclesiástica de Beda do latim para o anglo-saxão, ele também traduziu os Dez mandamentos, excertos do Êxodo, 21-23, de Atos, 15.23-29, e uma forma negativa da Regra áurea. Foi durante o seu reinado que a Inglaterra experimentou um reavivamento do cristianismo.
Aldred (950). Outro elemento foi introduzido na história da Bíblia inglesa quando Aldred escreveu um comentário nortumbriano entre as linhas de uma cópia dos evangelhos escrita no latim do final do século VII. É da cópia latina de Eadfrid, bispo de Lindisfarne (698-721), que a obra de Aldred recebe seu nome, os Evangelhos de Lindisfarne.
Aelfric (1000). Aelfric foi bispo de Eynsham, em Oxfordshire, Wessex, quando traduziu partes dos sete primeiros livros do Antigo Testamento. Essa tradução e outras partes do Antigo Testamento que ele traduziu e citou em suas homilias basearam-se no texto latino. Mesmo antes da época de Aelfric, os Evangelhos de Wessex foram traduzidos para o mesmo dialeto. Esses elementos constituem a primeira tradução existente dos evangelhos para o antigo inglês.
As Reduções Parciais Para O Médio Inglês (1100-1400)
Segundo Norman Geisler (1997, p. 221), “a conquista normanda (1066) deu-se graças à disputa em torno do trono de Eduardo, o Confessor. Com ela, o período do domínio saxônico na Inglaterra chegou ao fim, e um período de influência normando-francesa se fez sentir sobre a língua dos povos conquistados. Durante esse período de domínio normando foram feitas outras tentativas de traduzir a Bíblia para o inglês”.
Orm ou Ormin (1200). Orm foi um monge agostiniano que escreveu uma paráfrase poética dos evangelhos e de Atos acompanhada de comentário. Essa obra, o Ormulum, é preservada em um único manuscrito de 20.000 palavras. Embora o vocabulário seja puramente teutônico, a cadência e a sintaxe mostram a influência normanda.
Guilherme de Shoreham (1320). Shoreham freqüentemente recebe o crédito de ter produzido a primeira tradução em prosa de uma parte da Bíblia para um dialeto sulista do inglês, embora exista alguma dúvida quanto a ele ter sido realmente o tradutor dessa obra de 1320.
Ricardo Rolle (1320-1340). Rolle é conhecido como o "Eremita de Hampole". Foi responsável pela segunda tradução literal das Escrituras para o inglês. Vivendo perto de Doncaster, em Yorkshire, fez sua tradução da Vulgata latina para o dialeto inglês do norte. Sua tradução do Saltério foi amplamente divulgada e reflete o desenvolvimento da tradução da Bíblia inglesa até a época de John Wycliffe.
As Traduções Completas Para O Médio Inglês E Para O Inglês Moderno Em Fase Inicial
Embora não houvesse nenhuma Bíblia completa em inglês antes do século XIV, diversos indícios apontavam para o aparecimento iminente de uma. A ampla circulação do Saltério literal de Rolle na exata época em que a corte papal passava por lutas se associou ao chamado cativeiro babilônico (1309-1377). Esse acontecimento e suas conseqüências formaram o pano de fundo para a obra de outros tradutores bíblicos.
A Bíblia de Wycliffe. João Wycliffe (c. 1329-1384) - O mais eminente teólogo oxfordiano de seus dias - e seus associados foram os primeiros a traduzir a Bíblia inteira do latim para o inglês. Segundo Philip W. Confort (1998, p. 363), “Wycliffe foi chamado de a Estrela da Manhã da Reforma", porque audaciosamente questionou a autoridade papal, criticou a venda de indulgências, negou a realidade da transubstanciação (doutrina que diz que a substância do pão e do vinho é mudada em corpo e sangue de Jesus Cristo durante a missa) e falou abertamente contra as hierarquias eclesiásticas. O papa condenou Wycliffe por seus ensinamentos "heréticos" e pediu que a Universidade de Oxford o demitisse. Mas Oxford e muitos líderes governistas permaneceram ao lado de Wycliffe, de modo que conseguiu sobreviver aos ataques do papa.
Wycliffe acreditava que o caminho para prevalecer em sua luta contra a autoridade abusiva da Igreja Católica era tornar a Bíblia acessível às pessoas em sua própria língua. Desse modo, poderiam ler por si mesmas acerca da forma como cada uma poderia ter um relacionamento pessoal com Deus através de Jesus Cristo - independente de qualquer autoridade eclesiástica. Wycliffe, com seus associados, completaram o Novo Testamento por volta de 1380 e o Antigo Testamento em 1382. Enquanto Wycliffe concentrava seus esforços no Novo Testamento, um de seus associados, Nicolau de Hereford, fazia uma parte importante do Antigo Testamento. Wycliffe e seus companheiros, desconhecedores do hebraico e do grego originais, traduziram o texto do latim para o inglês. Depois de Wycliffe ter terminado seu trabalho de tradução, organizou um grupo de paroquianos pobres, conhecido como lolardos, para irem por toda a Inglaterra pregando as verdades cristãs e lendo as Escrituras na língua materna a todos os que ouvissem a Palavra de Deus. O resultado desse empreendimento foi que a Palavra de Deus, através da tradução de Wycliffe, tornou-se acessível a muitos ingleses.
Um dos associados mais chegados de Wycliffe, João Purvey (c. 1353-1428), continuou a obra de Wycliffe, lançando, em 1388, uma revisão de sua tradução. Purvey era um excelente erudito. Seu trabalho foi muito bem recebido por sua geração e pelas que se seguiram. Menos de um século depois, a edição revista de Purvey havia substituído a Bíblia inicial de Wycliffe.
William Tyndale (1492-1536). Após tentativas deploráveis de fazer sua tradução na Inglaterra, William Tyndale embarcou para o Continente em 1524. Após outras dificuldades, finalmente imprimiu o Novo Testamento em Colônia, no fim de fevereiro de 1526. Seguiu-se uma tradução do Pentateuco, em Marburgo (1530), e de Jonas, na Antuérpia (1531). Conforme Norman Geisler (1997, p. 224) “as influências de Wycliffe e de Lutero eram evidentes no trabalho de Tyndale e o mantiveram sob constantes ameaças. Além disso, essas ameaças eram tantas, que as traduções de Tyndale tiveram de ser contrabandeadas para a Inglaterra. Tendo chegado lá, exemplares foram comprados por Cuthbert Tunstall, bispo de Londres, que as fez queimar publicamente em St. Paul's Cross”. Conforme Norman Geisler (1997, p. 224) “em 1534, Tyndale publicou sua revisão do Gênesis e começou a trabalhar numa revisão do Novo Testamento. Pouco depois de completar essa revisão, foi seqüestrado na Antuérpia e levado à fortaleza de Vilvorde, em Flandres. Ali continuou a traduzir o Antigo Testamento”.
A Bíblia de Coverdale. Miles Coverdale era graduado de Cambridge e, como Tyndale, havia sido forçado a fugir da Inglaterra, porque fora grandemente influenciado por Lutero, à medida que audaciosamente pregava contra a doutrina católica. Enquanto estava no exterior, Coverdale encontrou-se com Tyndale e então passou a servi-lo de assistente - sobretudo ajudando-o na tradução do Pentateuco. Pela época em que Coverdale publicava uma tradução completa (1537), o rei da Inglaterra, Henrique VIII, rompia todas as relações com o papa e estava pronto para aceitar a publicação de uma Bíblia em Inglês.
A Bíblia de Rogers e a Bíblia Grande (1537). No mesmo ano em que a Bíblia de Coverdale foi endossada pelo rei (1537), outra Bíblia foi publicada na Inglaterra. Tratava-se do trabalho de alguém chamado Thomas Matthew, pseudônimo de João Rogers (c. 1500-1555), amigo de Tyndale. Obviamente, Rogers usou a tradução inédita dos livros históricos do Antigo Testamento feita por Tyndale, outras porções traduzidas por Tyndale e ainda outras porções da tradução de Coverdale para formar uma Bíblia inteira. Esta Bíblia também recebeu a aprovação do rei. A Bíblia de Rogers foi revisada em 1538 e impressa para distribuição nas igrejas de toda a Inglaterra. Conhecida como a Bíblia Grande por causa do seu tamanho e preço elevado, tomou-se a primeira Bíblia em inglês autorizada para uso público.
A Bíblia de Genebra (1524-1579). Os ingleses exilados em Genebra, Suíça, escolheram William Whittingham (1524-1579) para lhes fazer uma tradução em inglês do Novo Testamento. Whittingham usou a tradução latina de Teodoro Beza e consultou o texto grego. Essa Bíblia tornou-se muito popular, porque era pequena e de preço moderado. O prefácio e suas muitas anotações estavam impregnadas por forte influência evangélica, bem como pelos ensinamentos de João Calvino. Calvino foi um dos maiores pensadores da Reforma, renomado comentarista bíblico e o principal líder em Genebra durante essa época.
A Bíblia do rei Tiago – A King James Version (1611). Em janeiro de 1604, Tiago I foi convocado a comparecer à Conferência de Hampton Court. Na ocasião John Reynolds, presidente puritano da Faculdade Corpus Christi, em Oxford, levantou a questão de ser feita uma versão autorizada da Bíblia para todos os partidos dentro da igreja. Foi nomeada uma junta. Seis grupos de tradutores foram escolhidos: dois em Cambridge para revisar de 1Crônicas a Eclesiastes e os livros apócrifos; dois em Oxford para revisar de Isaías a Malaquias, os evangelhos, Atos e o Apocalipse; dois em Westminster para revisar de Gênesis a 2 Reis e de Romanos a Judas. Apenas 47 dos 54 homens escolhidos trabalharam de fato nessa revisão da Bíblia dos bispos.
As notas marginais acompanharam a nova revisão, e a chamada Versão autorizada nunca chegou a ser de fato autorizada, nem ser de fato uma versão. Ela substituiu a Bíblia dos bispos nas igrejas porque nenhuma edição dessa Bíblia foi publicada depois de 1606.
Três edições da nova tradução apareceram em 1611. Outras edições foram publicadas em 1612. Durante o reinado de Carlos I (1625-1649), o Parlamento Lon-go estabeleceu uma comissão para deliberar sobre a revisão da chamada Versão autorizada ou produzir uma tradução totalmente nova. Somente revisões insignificantes resultaram em 1629, 1638, 1653, 1701, 1762, 1769 e duas edições posteriores. Essas três últimas revisões foram feitas pelo Dr. Blayney de Oxford. Elas variaram em cerca de 75 mil pormenores do texto da edição de 1611. Pequenas mudanças continuaram a surgir no texto até datas recentes como 1967 no texto da Versão autorizada que acompanha a New Scofield reference edition [Nova edição de referência de Scofield]. Entrementes, foram feitas tentativas de trazer amplas alterações e correções às traduções inglesas da Bíblia em virtude de novas descobertas textuais e por conta da natureza mutável da própria língua (GEISLER, 1997, p. 231).
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