sábado, 27 de junho de 2020

HISTÓRIA DA IGREJA I

OBJETO DE ESTUDO.

Nesse mister, forneceremos a divisão da História Geral, relacionando-a com a História Bíblica e Eclesiástica, para depois esboçarmos a História da Igreja, com alguns dados acerca da Igreja evangélica brasileira

Empregamos como fontes principais desta apostila os livros: Manual Bíblico de Halley e História do Cristianismo - Dos apóstolos do Senhor Jesus ao século XX, de A. KNIGHT e W. ANGLIN, com recurso também a outras fontes, todas devidamente citadas no espaço próprio.

Há uma preciosa coleção, com dez volumes, de JUSTO L. GONZÁLEZ, que tem por título E Até os Confins da Terra -  Uma História Ilustrada do Cristianismo. A coleção é rica em detalhes históricos e ilustrações. Extraímos algumas informações dessa coleção.

II ESBOÇO DA HISTÓRIA GERAL

Segue a divisão clássica da História Geral, tal como estudada na escola:

PRÉ-HISTÓRIA - até a invenção da escrita (c. 4.000 a.C.).

IDADE ANTIGA - de 4.000 a.C. a 476 d.C. (Queda de Roma).

IDADE MÉDIA - de 476 a 1453 d.C. (Queda de Constantinopla).

IDADE MODERNA - de 1453 a 1789 d.C. (Revolução Francesa).

IDADE CONTEMPORÂNEA - aos nossos dias.

Algumas observações.

Os primeiros 11 capítulos do Gênesis desenvolvem-se na Pré-História.

Toda a História Bíblica desenrolou-se na Idade Antiga (Antiguidade).

O papado surgiu entre a Idade Antiga e a Idade Média, e o poderio da Igreja Católica cresceu exponencialmente na Idade Média.

O Islamismo surgiu na Idade Média (610 d.C.).

A Reforma Protestante (1517) ocorreu na Idade Moderna, mesmo período do Renascimento, do Iluminismo, da Invenção da Imprensa, das Missões Modernas e da Descoberta do Brasil (esta no contexto das Grandes Navegações).

A Idade Média foi chamada de “Idade das Trevas” pelo humanista italiano Francisco Petrarca (1304-1374).

III - ESBOÇO DA HISTÓRIA DA IGREJA

Qualquer divisão, classificação ou organização depende dos critérios adotados, e por isso pode haver algumas variações a depender do material consultado.

A seguir, tem-se um esboço que considero pertinente e útil para se ter uma visão panorâmica da História Eclesiástica:

Era Apostólica (33-100 d.C.).

Era Patrística (100-750).

1. Pais Apostólicos (100-150).

2. Apologistas e Polemistas (Sécs. II e III).

3. Pais Capadócios (Séc. IV).

4. Pais Pós-Nicenos (depois de 325).

Perseguições, controvérsias e heresias (250-313 d.C.).

Do Edito de Milão aos Carolíngios (313-800 d.C.).

Constantino. Concílios. Degeneração da Igreja Católica. Paganização. Papado. Monasticismo.

Carolíngios, Cisma, Cruzadas e Escolasticismo (800-1291).

Pré-Reformadores (principalmente dos Sécs. XII ao XV).

Reforma Protestante (1517-1648).

Marco histórico. Antecedentes históricos. Martinho Lutero. Surgimento da designação “protestantes”. Zwínglio. Calvino. Reforma “Magisterial” e Reforma Radical. A Reforma na Inglaterra (Os puritanos). A Reforma na França (Os huguenotes).

Pós-reforma.

A Contra-Reforma. Configuração da Europa. Efeitos de natureza diversa. Desenvolvimento da Fé Reformada. Pietismo. Metodismo. Avivamentos.

América e Brasil.

Estados Unidos. Movimento Holiness. Movimento Pentecostal. Conceito de “evangélico”. Classificação das igrejas evangélicas brasileiras. Neopentecostalismo.

Era Apostólica (33-100 d.C.).

A Era Apostólica encontra-se referida no Livro de Atos dos Apóstolos, único livro histórico do Novo Testamento, mas há informações nos demais Livros neotestamentários que lançam luz sobre esse período.

O Livro de Atos é o desenvolvimento da ordem de Jesus em At 1.8, no sentido de que a Igreja começasse em Jerusalém e se espalhasse primeiro pela Judeia, depois por Samaria e até aos confins da Terra. Note a ênfase no crescimento e desenvolvimento da Igreja em 2.41-47, 4.32-34, 9.31.

Pode ser que Paulo perseguisse em seu ministério o objetivo de alcançar os confins da Terra, entendendo tratar-se de uma cidade da Espanha  (cf. Rm 15.24) conhecida por Tartessos, possivelmente a Társis para a qual Jonas quisera fugir da presença de Deus, imaginando que, assim, faria coisa melhor do que pregar aos terríveis ninivitas (cf. Sl 22.27; 67; Is 23.1-18).

Lembremos que Atos se encerra aparentemente sem conclusão. Com efeito, Atos dos Apóstolos termina com a simples afirmação de que Paulo, em prisão domiciliar, pregava “sem impedimento algum” (At 28.31). Isso parece indicar que a História da Igreja não terminou, e é verdade. Estamos escrevendo a História da Igreja!

A chamada “Igreja Primitiva” conheceu o derramamento do Espírito, rápida expansão numérica, plantação de igrejas, viagens missionárias, formação dos primeiros líderes não apostólicos (presbíteros, diáconos, evangelistas, missionários).

O modelo básico da igreja eram as sinagogas, locais de reunião pública que os judeus criaram durante o Exílio Babilônico, e que perduraram depois do retorno a Judá.

Havia inicialmente uma comunidade de bens entre os irmãos (At 4.32), mas logo houve a necessidade de instituir-se o diaconato para cuidar da distribuição equânime dos donativos, porque surgiram conflitos, na Igreja em Jerusalém, entre os judeus nativos (“hebreus”) e os judeus de fala grega (At 6.3).

Reuniam-se os crentes nas casas, nas sinagogas ou em edifícios públicos. As reuniões davam-se no primeiro dia da semana, provavelmente em dois cultos. Os primeiros crentes cantavam hinos, faziam orações, liam as Escrituras, eram ensinados pelos presbíteros, celebravam a Ceia aos domingos.

Os cristãos do Primeiro Século possuíam declarações sucintas da Fé Cristã, semelhantes ao que se encontra em Rm 10.9,10, I Co 15.4 e I Tm 3.16. Um outro texto que resume um repertório da Fé Cristã é o de At 4.24-30. Depois apareceram os credos. O credo mais antigo é o Credo dos Apóstolos, surgido em Roma por volta de 340 d.C.

Foi na Era Apostólica que se realizou o Concílio de Jerusalém (49), com a presença de Paulo, Pedro, Tiago (irmão do SENHOR), Barnabé, entre outros, incluindo presbíteros (At 15).

Havia muitos aspectos positivos, mas também se deram alguns problemas, tais como episódios de imoralidade sexual, facções e disputas intestinas, falsos apóstolos, uso indevido dos dons espirituais, influência da cultura pagã (Corinto); movimento judaizante (Jerusalém, Galácia); gnosticismo embrionário (Ásia Menor); nicolaísmo (Pérgamo e Éfeso, na Ásia Menor).

Os líderes principais eram os apóstolos (At 2.42), mas havia presbíteros e diáconos nas igrejas.

Havia condições favoráveis à expansão missionária (tolerância religiosa por parte do Estado; dois idiomas internacionais, o grego e o latim; estabilidade política; suficiência de alimentos e abrigos para todos; estradas pavimentadas; sistema bancário; câmbio de moedas estrangeiras). Era a chamada “plenitude do tempos” (Gl 4.4). A Igreja avançou para as cidades gregas na Ásia e na Europa, dentro do Império Romano. Paulo e sua equipe missionária foram decisivos na evangelização dos gentios. Pedro e outros buscaram evangelizar os cerca de 4 milhões de judeus que habitavam o Império.

Judeus habitantes das cidades evangelizadas perseguiam os cristãos.

As heresias da época ficaram a cargo dos ebionitas, gnósticos (ainda em sede embrionária) e nicolaítas.

Nesse período ocorreram eventos históricos importantes, como o Incêndio de Roma, causado por Nero (64 d.C.), que culpou os cristãos; a Destruição de Jerusalém (70 d.C.); e a elaboração e conclusão do Novo Testamento.

Era Patrística (100-750).

Apesar de voltarmos, mais tarde, a períodos insertos na mesma Era Patrística, é de bom alvitre distinguir nominalmente essa fase, quando atuaram os chamados Pais da Igreja, porque é relevante, na teologia e na História da Igreja, a expressão “Era Patrística” ou “Era dos Pais da Igreja”.

(1) Pais Apostólicos (100-150).

Os chamados “Pais Apostólicos” foram discípulos diretos ou indiretos dos apóstolos e escreveram obras teológicas importantes.

Destacaram-se Clemente de Roma (30-100), Inácio de Antioquia (30-117), Papias (70-155) e Policarpo (69-159).

Merecem citação as seguintes obras literárias da época :

- Epístola aos Coríntios escrita por Clemente de Roma (bispo de Roma entre 91 e 100 d.C.);

- Sete Epístolas de Inácio de Antioquia, discípulo de João (c. 110 d.C.);

- Epístola de Barnabé (entre 90 e 120 d.C);

- Didaquê - Ensino dos Doze Apóstolos (c. 100 d.C.), que continha instruções práticas, como a forma de lidar com pregadores itinerantes;

- Pastor de Hermas (c. 150 d.C.), uma alegoria rica em simbolismo e visões, seguindo o modelo do Apocalipse. Segundo HALLEY, esse livro pode ser chamado de “O Peregrino da igreja primitiva”, em alusão ao célebre livro de John Bunyan.

Essas obras diferem radicalmente dos escritos apócrifos (ocultos, secretos) e pseudepígrafos, que começaram a surgir no Séc. II d.C. (Evangelho de Nicodemos, Evangelho de Pedro, Atos de João, Atos de André, Carta de Paulo a Sêneca, Carta de Pedro a Tiago etc.).

(2) Apologistas e Polemistas (Sécs. II e III).

Os Apologistas defendiam intelectualmente o Cristianismo (apologia é defesa). Surgiram principalmente no Séc. II.

Foram Apologistas os seguintes Pais da Igreja: Justino, o Mártir (100-170), Tertuliano de Cartago (150-230), Teófilo (181) e Aristides (início do Séc. II).

Os Polemistas combateram heresias. Surgiram principalmente no Séc. III.

Foram Polemistas os que seguem : Ireneu de Lyon (130-200), que combateu o gnosticismo, Cipriano (200-258), Tertuliano de Cartago (150-230) e Orígenes (185-254).

Houve perseguição infligida por Domiciano por causa do não pagamento de impostos pelos judeus (95 d.C.) - como os cristãos eram confundidos com os judeus, também foram perseguidos.

Nessa época João foi preso na ilha de Patmos.

Por meio de uma carta, o governador Plínio perguntou ao imperador Trajano sobre o procedimento correto a ser adotado quanto a cristãos delatados por sua fé (112 d.C.).

(3) Pais Capadócios (Séc. IV).

Os Pais Capadócios foram teólogos compreendidos entre os Concílios de Niceia (325) e Constantinopla (381). Foram eles Basílio de Cesareia (330-379), Gregório de Nissa (330-395) e Gregório de Nazianzo (330-389).

(4) Pais Pós-Nicenos.

No Ocidente, os Pais Pós-Nicenos foram João Crisóstomo de Antioquia (347-407) - ensinou que a Cruz e a ética são inseparáveis; Teodoro, bispo de Mopsuéstia (350-428) - valorizou o contexto histórico-gramatical do texto; e Eusébio (265-339) - escreveu a história eclesiástica a pedido de Constantino.

No Oriente, os Pais Pós-Nicenos foram Jerônimo de Veneza (347-420), que se estabeleceu em Belém para estudar e traduziu a Bíblia para o latim (a Vulgata); Ambrósio (340-397), administrador e pregador que confrontou a intromissão do Imperador na Igreja; e Agostinho de Hipona (354-430).

Agostinho é considerado o mais importante dentre todos os da Era Patrística. Filho de Mônica, uma crente piedosa, vivia ele uma vida de pecado, até que um dia, tendo ouvido uma voz para ler a Bíblia, deparou com o texto de Rm 13.13,14 e se converteu a Cristo. Sua obra reúne mais de 100 livros, 200 cartas, 500 sermões. Para os católicos são importantes sua doutrina do Purgatório, sua ênfase na Igreja como instituição visível e o destaque aos sacramentos do batismo e da comunhão. Para os protestantes é valiosa sua defesa da doutrina da salvação pela graça, por Cristo Jesus. A autobiografia Confissões é um importante livro de Agostinho.

HISTÓRIA DA IGREJA II

PERSEGUIÇÕES, CONTROVÉRSIAS E HERESIAS (250-313 d.C.):

A perseguição estatal sistemática e ostensiva contra os cristãos começou em 250, e por razões políticas, religiosas, econômicas, sociais e religiosas. Os cristãos eram tidos por desleais ao Imperador, por não lhe prestarem culto. Também não tomavam parte nos cultos e sacrifícios pagãos e vieram a ser considerados ateus por não cultivarem uma religiosidade carregada de aparatos externos. Além disso, foram antipatizados por seu entendimento de que todos os homens são iguais, sem distinção entre livres e servos, por exemplo.

O marco dessa perseguição foi o edito do imperador Décio (250), que tornou ilegal a religião cristã.

Edito do imperador Diocleciano (303) incrementou a perseguição, determinando a prisão dos crentes, que já somavam 15% da população do Império Romano (de 50 a 75 milhões de pessoas). Como os cárceres ficaram superlotados, sem espaço para os verdadeiros malfeitores, a prisão foi substituída pelas penas de exílio, perda de bens, execução (à espada ou por animais selvagens), trabalhos forçados, prisão (os cárceres ficaram superlotados, e por isso os cristãos passaram a  receber as outras penas mencionadas).

Naquele período fortaleceu-se a heresia do Gnosticismo (ascético ou licencioso).

Houve concílios eclesiásticos para dirimir dúvidas e revolver problemas.

Surgiram controvérsias teológicas (livre-arbítrio ou não? O homem nasce em pecado ou se torna pecador? Como somos salvos?) e disciplinares (o que fazer com os cristãos que, sob pressão, ofereceram sacrifícios ou queimaram as Escrituras?).

A queima das Escrituras levou à necessidade de identificação dos Livros Canônicos.

É interessante que a atuação de hereges contribuiu, curiosamente, para a sedimentação da doutrina cristã, dado o esforço dos Pais da Igreja em rebater as impropriedades ensinadas e escritas por aqueles homens.

DO EDITO DE MILÃO AOS CAROLÍNGIOS (313-800 d.C.).

Constantino.

O imperador Constantino (274-327) estava numa batalha quando avistou no céu a frase “Com este sinal vencerás” (in hoc signus vinces, em latim). O sinal era a Cruz. Ele entendeu que deveria se aliar ao Cristianismo, religião já bastante numerosa. Não afirmarei que Constantino se converteu. Ele continuou como sumo-sacerdote da religião estatal e foi batizado pouco antes de morrer. Mas não se pode negar a influência dele na História da Igreja, em termos positivos e negativos.

Por meio do Edito de Milão (313), Constantino decretou a tolerância para com os cristãos, ensejando liberdade de culto; isenção dos clérigos quanto ao serviço público; subsídio estatal às igrejas; devolução dos bens confiscados; domingo como dia de descanso e de culto.

Já o imperador Teodósio I foi quem tornou o Cristianismo a religião oficial do Império Romano (380).

Concílios.

Nesse período a Igreja cedeu a muitas heresias pagãs, porém combateu outras, tais como o arianismo, o apolinarismo e o nestorianismo. As grandes questões teológicas eram discutidas nos Concílios Eclesiásticos ou Ecumênicos. Entre 325 a 787 houve Sete Concílios.

As doutrinas dos quatro primeiros Concílios são seguidas até hoje. São eles, com um resumo de suas declarações:

Concílio de Niceia I (325): Jesus é Deus.

Concílio de Constantinopla (381): o Espírito Santo é Deus.

Concílio de Éfeso (431): depois do debate entre Agostinho e Pelágio (teólogo britânico - c. 354-415), se entendeu que a salvação se dá pela graça, pois o homem nasce contaminado pelo pecado de Adão e não pode escolher livremente entre o bem e o mal.

Concílio de Calcedônia (451): Jesus é verdadeiro Deus e verdadeiro Homem.

Degeneração da Igreja Católica.

A degeneração da Igreja Católica deu-se de modo lento, progressivo e motivado por fatores diversos.

Paganização.

O lado mais ocidental do Império Romano vinha sofrendo as invasões de tribos bárbaras desde o fim do Séc. I até a desintegração do Império em 476 d.C., data da transição da Idade Antiga para a Era Medieval.

Por influência desses povos, a Comemoração do Natal de Jesus passou a ser realizada na época da festa do solstício do inverno. Essa transição ocorreu em 350.

O paganismo veio trazendo uma influência insistente e duradoura. Passou a haver forte distinção entre clero e laicato, veneração de santos por meio de relíquias, quadros e estátuas.

Além de batismo e Ceia, acrescentaram-se como sacramentos o casamento, a penitência, a ordenação, a confirmação e a unção dos enfermos.

Papado.

Nos Séculos V a VIII, de acordo com o historiador JUSTO L. GONZÁLEZ, as duas forças mais destacadas do Cristianismo Ocidental foram o papado e o monasticismo, que contribuíram para a conversão dos bárbaros e a preservação da cultura antiga.

Vejamos como teve início o papado.

Em 313 o bispo de Roma considerou-se Primus inter pares (“o primeiro entre iguais”).

Quando da invasão e saque de Roma pelos visigodos (410), a reação decisiva do bispo de Roma evidenciou seu poder.

Leão I, bispo de Roma, considerou-se superior aos demais bispos (440).

Gregório I (Magno) declarou que Leão fora o primeiro papa (590). Gregório I era escritor, pregador, teólogo e músico. Desenvolveu o “canto gregoriano”. Disputou com o bispo (patriarca) de Constantinopla, porque este se pretendia “bispo universal”. Não aceitou o título de “papa”, mas agiu como tal. Estendeu o domínio católico a igrejas da Inglaterra e Espanha.

Vale observar que, segundo alguns estudiosos, Diótrefes, citado em III Jo, é tido como “o primeiro bispo monárquico”, por ter pretendido “exercer a primazia” entre os irmãos, sendo possivelmente ele um bispo (presbítero). Ele pode ter sido, desse modo, um precursor do papado.

Monasticismo.

Como resposta à degradação espiritual e moral da Igreja Católica, surgiu no Séc. IV o Monasticismo, pautando-se pelos ideais da contemplação e do ascetismo. Esse movimento cresceu muito no Séc. VI, popularizou-se nos Sécs. X e XI e depois no Séc. XVI. Ainda hoje se pratica, mas em menor escala.

Tornou-se famosa, antes do ano 800, a Regra de São Bento (ou São Benedito): um conjunto de regras alimentares, votos de castidade, pobreza e obediência, divisões do dia para leitura, adoração e trabalho.

Houve importante obra intelectual, missionária, cultural e social nos mosteiros (500 a 1000), mas a vida ascética limitava seu alcance.

CAROLÍNGIOS, CISMA, CRUZADAS E ESCOLASTICISMO (800-1291):

Carolíngios.

A família dos Carolíngios governou boa parte da França e dos Países Baixos, além de países onde hoje se fala alemão e, ainda, a Itália.

Um carolíngio foi Carlos Martel (ou Carlos Martelo), que impediu o avanço dos muçulmanos na Europa (em Tours). Pepino foi outro carolíngio.

Carlos Magno, filho de Pepino, veio a ser coroado em 800, e pediu para receber a coroa das mãos do papa. Ali nascia o Sacro Império Romano, pela harmonização entre os interesses temporais e católicos.

Cisma.

As Igrejas do Ocidente e do Oriente já viviam como entidades separadas, mas em 1054 houve o Cisma, e por uma questão doutrinária muito simples, a saber: se o pão da Ceia devia ser levedado ou não. A Igreja Católica Apostólica Romana e a Igreja Ortodoxa Oriental afastaram-se definitivamente, com a excomunhão recíproca dos seus líderes principais (o papa e o patriarca). Hoje as principais Igrejas da corrente oriental são a Igreja Ortodoxa Grega e a Igreja Ortodoxa Russa.

Cruzadas.

As Cruzadas (1095-1291) foram operações militares solicitadas pela Igreja Oriental, promovidas pelos papas (da Igreja Ocidental, portanto) e comandadas pelos nobres contra a tomada da Terra Santa por muçulmanos. Estavam envolvidos interesses políticos e econômicos, não apenas religiosos.

Um dos frutos das Cruzadas foi o efêmero Reino de Jerusalém (1100-1187).

A Cruzada das Crianças (1212) contou em suas hostes com meninos de 12 anos de idade.

A expulsão dos cruzados pelos muçulmanos, da cidade de Acre, na Terra Santa, marcou o fim das Cruzadas (1291).

Deu-se o fortalecimento do papado durante as guerras, mas enfraquecimento paulatino em razão do nacionalismo dos cruzados. As cidades foram fortalecidas à medida que os nobres vendiam suas propriedades aos cidadãos, para financiar as batalhas, ou não retornavam do Oriente.

Foi nessa época que surgiram as catedrais góticas. Também apareceram novas ordens monásticas.

Escolasticismo.

O Escolasticismo foi um movimento intelectual de conciliação entre a ciência e literatura gregas e a teologia cristã, uma aproximação entre razão e fé.

Destacaram-se no período Anselmo de Cantuária (c. 1033-1109) e Tomás de Aquino (1225-1274).

HISTÓRIA DA IGREJA III

OS PRÉ-REFORMADORES (PRINCIPALMENTE DOS SÉCS. XII AO XV).

Os chamados “pré-reformadores” ou “precursores da Reforma” levantaram-se contra atitudes erradas da Igreja Romana.

Citemos alguns deles:

Cláudio (?-839­), bispo da cidade de Turim, mais tarde seria considerado “o protestante do século IX” porque reprovou a adoração a imagens e relíquias, as orações aos santos, as peregrinações a Roma e a designação do papa como “senhor apostólico”. Seus seguidores foram expulsos para as montanhas (Piemonte). Note que ele atuou bem antes do período da Pré-Reforma propriamente dita.

Pedro de Bruys (?-c. 1130), presbítero no Sul da França, pregou contra práticas e vícios de Roma (construção de igrejas ricas, crucifixos, doutrina da transubstanciação, celebração da missa, eficácia das esmolas e orações pelos mortos). Por isso, foi perseguido e queimado vivo.

O monge Henrique de Lausanne ou Henrique de Cluny (?-1147) pregou em favor da simplicidade e viveu de maneira humilde. Morreu na prisão em Toulouse. Era um seguidor da doutrina de Pedro de Bruys.

Vários cristãos tidos por “hereges”, provavelmente discípulos de Bruys e Henrique  - por isso, chamados de “petrobrussianos” e “henricianos” - vieram a ser martirizados na cidade de Colônia.

Pedro Valdo (? – 1179), um comerciante de Lyon, distribuiu seus bens aos pobres, financiou suas próprias viagens para pregar o Evangelho na língua do povo e contribuiu para a tradução e distribuição da Bíblia. Seus seguidores foram chamados de “valdenses” e “Homens pobres de Lyon”. Esse movimento estabeleceu-se, nos Alpes, entre os vales dos Vaudois, com outros cristãos. No Séc. XVI, os valdenses incorporaram-se à Reforma Protestante.

Pedro Abelardo (1079-1142), bretão, foi um pregador leigo muito popular e inteligente.

O monge Arnaldo de Brescia (1090-1155), discípulo do pregador Pedro Abelardo, criticou a opulência do clero romano. Por causa disso foi exilado e enforcado. Seu corpo foi queimado, sendo as cinzas lançadas no rio Tibre.

Francisco de Assis (1182-1226), certamente mais conhecido que todos os acima citados, fundou a  ordem religiosa dos “Irmãos Menores”, pautada pela simplicidade. Ele tinha uma concepção de salvação individual e coordenou a construção de igrejas amplas e modestas, dando espaço ao povo. Inspirou-se em Pedro de Bruys, o comerciante que se tornou eremita, como visto acima.

O monge dominicado Jerônimo Savonarola (1452-1498) defendeu a simplicidade da vida monástica e foi um grande pregador. Foi martirizado pelo fogo.

Um dos principais precursores da Reforma foi João Wycliff  (c. 1324-1384), professor da Universidade de Oxford. Ele traduziu a Bíblia para o inglês. Inspirado em Robert Grostete (1168-1253), entendeu que o papa era o Anticristo.

Os lollardos foram um movimento religioso que se identificou muito com o ensino de Wycliff, conquanto já existisse antes dele. Houve entre eles vários mártires, a exemplo de Guilherme de Sawtrey (?-1401) e João Badby (?-1410), que foram queimados vivos.

João Huss (1369-1415), que era da Boêmia (parte da atual República Checa), foi pregador da capela de Belém e deão da faculdade de filosofia. Ele era admirador da doutrina de Wycliff, e, assim como ele, se tornou um dos principais precursores da Reforma. Foi queimado vivo.

Um amigo de Huss, Jerônimo de Praga (1379-1416), também foi queimado vivo.

Houve algumas guerras que envolveram os hussitas (seguidores de Huss), por causa de sua fé.

Na Morávia, também parte da atual República Checa, teve origem o movimento dos Irmãos Reunidos (Unitas Fratrum) ou Irmãos Morávios. Esses cristãos foram fixados compulsoriamente nos territórios da Morávia e da Silésia, e, embora duramente perseguidos, mantiveram sua fé, refugiando-se em cavernas e bosques. Concluíram a tradução da Bíblia para a língua boêmia, imprimindo várias cópias. Mais tarde, no Séc. XVIII, foram acolhidos e financiados pelo piedoso Conde Zinzendorf (1700-1760), da Alemanha, o que ensejou o nascimento de um relevante trabalho missionário.

João de Wessalia (?-1479), doutor em teologia em Erfurt,  pregou a mensagem de salvação sem as obras. Por isso foi preso e torturado, vindo a morrer na prisão.

O holandês João Wesselus (c. 1419-1489), amigo de João de Wessália, foi um teólogo cujas ideais viriam a ser mais tarde defendidas por Lutero, que reconheceu esse fato.

Em resumo, na Pré-Reforma houve pregações contra as seguintes doutrinas e práticas da Igreja Romana:

- Autoridade espiritual e poder temporal do papa;

- Venda de indulgências;

- Corrupção clerical;

- Penitências;

- Confissões;

- Missa;

- Transubstanciação;

- Extrema-unção.

Ademais, a Pré-Reforma foi caracterizada por :

- Proclamação da mensagem de salvação pela graça de Cristo, e não pelas obras;

- Valorização da pregação no idioma do povo;

- Tradução e distribuição da Bíblia;

- Perseguição por parte de Roma e martírio de muitos irmãos.

A era dos pré-reformadores também conheceu aspectos negativos (intrigas, erros na interpretação da Bíblia), o que é próprio do Ser Humano. No entanto, ali estava a ação divina preparando  o terreno para a Reforma Protestante, em séculos de dominação católica.

REFORMA PROTESTANTE (1517-1648).

Marco histórico.

O marco histórico da Reforma Protestante é o dia 31 de outubro de 1517, quando o monge alemão Martinho Lutero afixou suas 95 Teses na porta da capela da Universidade de Wittemberg, apontando erros da Igreja Católica, entre as quais a venda de indulgências.

Antecedentes históricos.

Um antecedente histórico muito importante para a Reforma foi a Renascença ou Renascimento, movimento intelectual, cultural, ideológico e artístico caracterizado por individualismo, humanismo, questionamento da autoridade da Igreja, florescimento literário e intelectual, bem como restauração das artes e da filosofia da Antiguidade Clássica.

Outros antecedentes foram os protestos de trabalhadores depois da Peste Negra (advinda em 1347); o Cisma da Igreja Ocidental, que chegou a ter dois papas a partir de 1378 – um em Roma e outro em Avignon, na França – contando com três papas por breve período no século seguinte; a invenção da imprensa, em 1439, por João Gutemberg (1398-1468); a existência de dificuldades políticas entre o poder papal e os Estados nacionais que se formavam, gerando conflitos em torno de questões como a imensa propriedade de terras sobre as quais a Igreja não pagava impostos; as divergências entre a Igreja e os comerciantes, que não concordavam com os regulamentos das guildas (espécie de sindicatos de comerciantes) nem com a proibição da “usura” (empréstimo a juros).

Cremos que Deus tem total controle sobre a História. De um modo misterioso para nós, acontecimentos históricos foram manejados por Deus para a Sua própria glória e consecução de Seus desígnios.

Martinho Lutero.

Martinho Lutero (1483-1546) foi o personagem usado por Deus para romper institucionalmente com a Igreja Romana, e sua atuação teve início depois de deparar com a opulência e corrupção do clero em Roma. Foi auxiliado teologicamente por Filipe Melanchthon (1497-1560), responsável pela elaboração da Confissão de Augsburgo.

Trabalhando como professor de teologia na Universidade de Wittemberg, onde obteve o título de doutor, Lutero estudou a Bíblia nas línguas originais, e concluiu que a verdade só pode ser achada na Palavra de Deus, além de que o homem somente pode ser justificado pela fé em Cristo, de acordo com a passagem encontrada em Rm 1.17 (isto se deu em 1516).

O Papa Leão X construía a Basílica de São Pedro, e, para isso, precisava de recursos. Na Alemanha, o arcebispo Alberto, que já dirigia irregularmente duas províncias eclesiásticas, intentava dominar uma terceira, e prometeu entregar ao papa uma quantia expressiva, que desejava extrair por meio da venda de indulgências.

As famosas indulgências eram formalizadas em documentos entregues a quem fizesse orações, penitências, peregrinações, boas ações e, principalmente, pagamentos à Igreja.

A fim de alcançar seu objetivo, o arcebispo Alberto solicitou o apoio do monge João Tetzel, mas Lutero opôs resistência à propaganda por ele realizada.

Indignado com a pregação de indulgências por parte de João Tetzel, a pedido de Alberto, o reformador alemão afixou as célebres 95 Teses, no dia 31 de dezembro de 1517, na porta da capela da Universidade de Wittemberg.

Em 1518, por ocasião da Dieta (assembleia deliberativa) de Augsburgo, Lutero e outros irmãos firmaram o entendimento de que a autoridade pertence à Bíblia, e não ao papa.

Em 1520 Lutero publicou panfletos defendendo as teses de que os príncipes (governantes) devem reformar a Igreja quando necessário, e de que os sacerdotes não devem ministrar os sacramentos, pois todos os crentes são sacerdotes (sacerdócio universal).

Em razão disso, Lutero foi excomungado, por meio da bula Exsurge Domine, e seus livros vieram a ser queimados na cidade de Colônia. Em resposta, o reformador queimou a bula papal.

Em 1521, Martinho Lutero foi convocado para se explicar à Dieta de Worms, mas recebeu proteção dos príncipes alemães e não se retratou. A fim de escapar à perseguição, foi raptado e escondido por seus amigos no castelo de Wartburg, onde estudou, escreveu, atuou para erguer o sistema escolar na Alemanha e traduziu a Bíblia para o alemão. Casou-se, em 1525, com Catarina von Bora.



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